Motivação para Usar o Orkut: Aplicação de Um Instrumento Piloto, Construção de Uma Metodologia e Análise dos Resultados Preliminares
Written by Adonai Estrela Medrado   
Monday, 30 June 2008 19:02

Sobre

Este trabalho foi apresentado em maio/2007 na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (FFCH) da Universidade Federal da Bahia (UFBA) por Adonai Medrado, Daniela Navaes e Mariana Sobral. A compilação que se segue contém pequenas alterações textuais.

Introdução

O Orkut é um site de relacionamentos. Criado, segundo a Wikipedia (2007), por um engenheiro de software da Turquia, Orkut Büyükkökten, em 22 de janeiro de 2004. O Orkut tem hoje milhões de usuários dos quais 55,88% são brasileiros e 58,26% têm entre 18 e 25 anos (Orkut, 2007a).

Esta pesquisa surgir da percepção por partes dos pesquisadores do quão real e intrigante é esta estatística sobre os brasileiros. Nos pontos de acesso público à Internet é corriqueiro observar pelo menos um usuário acessando o Orkut. Por que isto acontece? O que faz os usuários acessarem e continuem acessando o Orkut? Qual é o fator motivante? Por que alguns afirmam que “amam o Orkut”? O que faz alguém pagar relativamente caro em um lan-house para acessar este site?

O Orkut se auto-define como “uma comunidade on-line criada para tornar a [...] vida social [dos seus membros] e a de seus amigos mais ativa e estimulante” (Orkut, 2007b). Esta auto-definição também contém seu principal objetivo. Será que este objetivo foi atingido e por isto as pessoas acessam o Orkut? E caso positivo, o que significa uma vida social mais ativa e estimulante? É possível ter uma “vida social” no mundo virtual?

Na nossa visão, o Orkut se tornou um dos principais meios de comunicação entre seus usuários. Além disto, caracteriza-se principalmente por ser de fácil manuseio e por expor dados da vida pessoal. Como tantas outras invenções tecnológicas, seu sucesso pode implicar no detrimento da sociabilidade, afetividade e sentimentos. Acreditamos que ao investigarmos os motivos que levam indivíduos a passarem horas em frente ao computador, comunicando-se de forma às vezes tão calorosa e íntima, sem qualquer espécie de contato físico, poderemos contribuir para verificar os efeitos do Orkut na sociedade.

Este trabalho lança mão das teorias de motivação para criar hipóteses que possam explicar este comportamento, cria um questionário piloto e testa algumas metodologias na busca de encontrar e coletar dados preliminares. Esperamos que estes dados indiquem tanto como proceder um estudo capaz de responder às perguntas lançadas quanto a validade e relevância das hipóteses desenvolvidas.

Aceitação e Aprovação Social

Vernon (1971, p. 166) afirma que “crianças e adultos são motivados a comportar-se visando a sociabilidade com outras pessoas e a obter aceitação e aprovação sociais”. No Orkut, a aceitação é medida tanto qualitativamente quanto quantitativamente. Os comportamentos podem ser divulgados através de fotos e do perfil, aprovados qualitativamente através dos testemunhos e recados e quantitativamente através da quantidade de fãs e amigos.

É importante atentar para o destaque dado à quantidade de amigos (talvez até em detrimento da qualidade). Observa-se que ao mesmo tempo em que quantidade significa aprovação, também é segurança. Para Vernon (1971), a complexidade da vida faz com que os indivíduos procurem a segurança dos seus grupos. Quanto maior o grupo, em tese, maior a segurança. O Orkut é capaz de contabilizar o tamanho deste grupo.

O usuário do Orkut ainda pode participar de comunidades que agregam grupo de pessoas com mesmos interesses ou opiniões. Verificando algumas comunidades (por exemplo, a “Eu amo o Orkut”), percebe-se a pouca participação dos seus membros nos tópicos de discussão, levando-se à conclusão que o importante é o pertencer. Corrobora mais uma vez a hipótese de Vernon (1971) de que há satisfação e prazer no pertencer, no ter lugar entre os iguais. E mais; para ele, estes sentimentos independem “de sentimentos pessoais de afeto e amizade para com membros individuais do grupo” (VERNON, 1971, p. 169).

Ainda conforme Vernon (1971), a auto-estima é um grande motivador. Ver a quantidade de amigos e fãs, saber a porcentagem dos amigos que o acham legal, confiável e sexy são, sem dúvida, reforçadores para a auto-estima.

Metodologia

Um dos primeiros desafios desta pesquisa foi definir uma amostra. Qual seria a melhor forma de escolher os indivíduos para participarem da pesquisa? Devido às dificuldades enfrentadas foram utilizadas três abordagens distintas: postagem de tópico em comunidade, abordagem direta dos participantes e pesquisa de campo em lan-houses.

Nas duas primeiras abordagens escolheram-se membros da comunidade “Eu Amo o Orkut”. Esta comunidade foi escolhida pelo seu nome bastante emotivo e por possuir em maio/2007 mais de 62 mil membros.

Para entrar em contato com os possíveis participantes e postar na comunidade foi criado um perfil cujo nome era “Pesquisa Motivação Orkut”, com o e-mail This e-mail address is being protected from spambots. You need JavaScript enabled to view it , que possuía como amigos unicamente os três pesquisadores e como comunidade unicamente a “Eu amo o Orkut”. Todos os contados com os participantes foram feitos através deste perfil/e-mail.

A primeira abordagem consistiu em postar na comunidade um tópico de discussão solicitando aos interessados em participar da pesquisa postar seu e-mail, para que fossem-lhes enviado um questionário ao qual deveriam responder.

Não obtivemos sucesso por este método: não houve resposta alguma no prazo de 5 dias. Algumas hipóteses para este insucesso: (1) a solicitação para postagem do endereço de e-mail na própria comunidade pode ter sido vista como tentativa para espalhar pragas virtuais ou enviar spam e (2) os usuários não têm costume de participar dos tópicos da comunidade.

A segunda abordagem foi de envio de recados (scrap) para alguns membros da comunidade. Os membros que receberam os recados foram selecionados aleatoriamente pelos pesquisadores em número aproximado de 100. O recado enviado era padronizado, todo membro recebia o seguinte texto: “Gostaríamos de ter sua participação em uma pesquisa sobre 'Motivação para Utilizar o Orkut'. Em outras palavras, queremos responder: por que você está aqui? A participação envolve responder a um pequeno questionário on-line. Para participar basta responder este SCRAP com o e-mail para o qual devemos enviar o questionário. Mais informações sobre a pesquisa entre no nosso profile”.

Alguns participantes respondiam, porém ao invés de enviar o e-mail como solicitado, informavam suas motivações. Para estes foi enviado um outro recado, também padronizado: “Obrigado pela resposta [nome do membro], mas precisamos que responda com o e-mail para podermos enviar o questionário. Muito Obrigado.”

Alguns enviaram dúvidas ou perguntas as quais pela variedade foram respondidas de forma não padronizada.

O próximo passo nesta abordagem foi o envio do questionário para o endereço de e-mail que os potenciais participantes forneceram. O questionário era enviado no corpo do e-mail em formato de “somente texto”, sem nenhum formatação de negrito, itálico ou sublinhado. Escolhemos enviar no próprio corpo da mensagem para evitar o uso de anexo ou de links os quais são comumente associados a pragas virtuais.

O questionário continha 12 questões, das quais 8 eram de múltipla escolha e 4 com resposta livre. A principal questão para os objetivos do trabalho era “Por que você ama o Orkut? Cite até 5 motivos”.

Um total de 22 e-mails foram enviados, dois quais somente 5 foram respondidos. O período de espera pelas respostas foi de 10 dias. A quantidade de respostas obtidas foi considerada insuficiente para os objetivos deste trabalho.

Na terceira e última abordagem adaptou-se o questionário para a aplicação em lan-houses. Este público foi escolhido por estarem pagando, de forma imediata, para acessar o Orkut. Foi alterada a questão de motivação de “Por que você ama o Orkut? Cite até 5 motivos” para “Por que você acessa o Orkut? Cite até 5 motivos”. Os usuários eram abordados quando saiam da lan-house. O questionário não era entregue aos participantes, os pesquisadores faziam as perguntas e assinalavam as respostas eles mesmos (entrevista estruturada).

Resultados

A segunda abordagem (envio de recado diretamente para os membros da comunidade “Eu amo o Orkut”) obteve alguns resultados inesperados, porém bastante ricos. Como já citado, alguns dos participantes ao invés de responderem com o endereço de e-mail como foi solicitado, enviavam seus motivos para acessar o Orkut. A maioria das respostas destacava o “conhecer novos amigos” e o “manter contato com pessoas”, entretanto um grupo específico de resposta merece atenção pelas relações e discurso.

Um participante, interpretou nossa mensagem de forma equivocada e, aparentemente, pensou que estávamos realizando uma pesquisa para saber se entraríamos ou não no Orkut. Escreveu-nos o seguinte:

Sempre digo que aqui no orkut tenho uma outra família.
Já deletei por três vezes minha conta,porque como no mundo lá fora,há pessoas maldosas aqui tbém...fiquei perplexa qdo fui surpreendida com isso aqui. Mas acabei voltando,pois o carinho é sincero e a amizade creio que é duradoura.
Amo mesmo o orkut,tenho nele pessoas da família,amigos reais e os virtuais que tbém sei que são pessoas que compartilham das mesmas dores,alegrias e amores.
Espero ter ajudado na pesquisa,ah...também encontrei pessoas maravilhosas através do orkut,pessoas sensíveis...que como eu gostam de poesias,músicas,todo tipo de cultura.
Beijos em seu coração e um pedido...se for ficar por aqui me add,está bem?
Amo novos amigos.

A expressão “mundo lá fora” se assemelha ao termo “vida externa” utilizada por outro participante: “[...] acho q aki posso encontrar pessoas q nem sempre teremos chance de conhecer pela vida externa... aqui facilita bastante! e para comunicação eh bem facilitado tmb! [...]”.

Um fato interessante que aconteceu nesta abordagem é que alguns dos potenciais participantes quiseram adicionar o perfil da pesquisa como amigo. Estas tentativas não foram autorizadas e enviamos um recado explicando que o perfil era da pesquisa e somente os pesquisadores deveriam constar como amigos.

Foram considerados 5 questionários enviados por e-mail e 11 dos de lan-houses. Estas quantidades foram suficientes para avaliar o instrumento e para dados preliminares. Verificou-se a repetição das respostas na principal pergunta do questionário (“Por que você acessa o Orkut?” ou “Por que você ama o Orkut?”, dependendo da abordagem).

Citaremos somente os resultados encontrados nas lan-houses devido ao baixo aproveitamento dos questionários por e-mail. Dos 11 usuários, 4 foram mulheres e 7 homens, a média de idade foi de 28,18 anos com desvio padrão de 9,08. Somente 1 participante não tinha completado o ensino médio, 4 tinham o ensino médio completo e 6 o ensino superior incompleto. Os usuários acessavam o Orkut há uma média de 21 meses. Um participante não possuía computador. Somente em 1 caso não houve correspondência entre a freqüência de acesso à Internet e a freqüência de acesso ao Orkut. Neste caso a Internet era acessada diariamente e o Orkut 3 vezes por semana.

Com relação à pergunta “Ao entrar na Internet, o que você acessa primeiro?” obtivemos as seguintes respostas: e-mail (4 pessoas), orkut (3 pessoas), notícias (2 pessoas), página do provedor (1 pessoa) e MSN (1 pessoa). Estas respostas sugerem que e-mail e Orkut são igualmente utilizados como forma de comunicação, uma melhor investigação necessita ser feita.

Na questão “Como você classificaria o Orkut?” foram dadas 5 opções: Indispensável, Necessário, Útil, Interessante e Outros. A classificação majoritária foi Interessante (7 pessoas), seguida de útil (3 pessoas) e Necessário (1 pessoa).

Com relação à pergunta “Por que você acessa o Orkut?”, as respostas foram categorizadas conforme três categorias: rede de amigos e familiares, recados, controle e outros. A categoria de rede de amigos e familiares foi a que obteve maior quantidade de respostas relacionadas.

Discussão

As pessoas usam o Orkut em busca de aceitação e aprovação, os recados são um recurso que possibilita a aprovação, a menção a ele apareceu em diversas respostas. Na mesma proporção, as respostas de controle que buscam saber quem são os visitantes indica que o visitado atribui certo status às visitas, podendo inclusive desejar e esperar certas pessoas.

As pessoas usam o Orkut para aprovar ou reprovar, modelando comportamentos. O “olhar a vida dos outros” pode ter como objetivo aprovar ou reprovar comportamentos.

As pessoas usam o Orkut desejando os sentimentos de serem queridas e lembradas e, por conseguinte, ter a auto-estima elevada. Mostrou-se um desejo de interação. Talvez, apesar do preconceito, no ambiente virtual existe a socialização e o estreitamento de laços familiares e de amizade. As afirmações que mais apareceram foram relacionadas à rede de amigos e familiares. Ter notícia dos outro e informar sobre si.

As pessoas usam o Orkut para se sentir parte de grupos. A maioria das respostas da categoria rede de amigos e familiares parece apontar para favoravelmente para esta hipótese.

Considerações Finais

O estudo apresentou resultados promissores. Existem indícios de que as hipóteses levantadas são válidas, porém, devido a pequena amostra e ao caracter inicial do estudo, do método e do instrumento qualquer afirmação categórica será, sem dúvida, inapropriada e prematura.

Achamos que a amostra de usuários em lan-houses e nas comunidades sobre o Orkut (como “Eu amo o Orkut” e similares) é adequada para os propósitos da pesquisa. Entretanto, o método apropriado para a pesquisa on-line está longe de ser o adequado. Uma proposta de metodologia seria não utilizar o questionário por e-mail, mas sim “jogos de pergunta e resposta” utilizando o recuso de recados do próprio Orkut. Nestes jogos, o pesquisador enviaria para o participante uma pergunta como um recado, ao qual ele responderia. Seria estipulada uma periodicidade para o envio, por exemplo, diariamente ou semanalmente.

Referências

NOTÍCIA. In: ORKUT. 2007. Disponível em: http://www.orkut.com/MembersAll.aspx. Acesso: 6 de maio de 2007.

ORKUT In: WIKIPEDIA, the free encyclopedia. 2007. Disponível em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Orkut>. Acesso: 6 de maio de 2007.

SOBRE. In: ORKUT 2007. Disponível em: <http://www.orkut.com/About.aspx>. Acesso: 6 de maio de 2007.

VERNON, M.D. Motivação Humana. Rio de Janeiro: Editora Vozes. 1971.

Last Updated on Monday, 30 June 2008 19:32